Em recente declaração, a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, afirmou que, não fosse pelo Supremo, haveria “213 milhões de pequenos tiranos” no Brasil. A fala, que poderia passar despercebida aos desatentos, é na verdade um retrato revelador de como parte do Judiciário enxerga o cidadão brasileiro: não como sujeito de direitos constitucionais, mas como uma ameaça que precisa ser contida.
Essa percepção é perigosa, pois inverte por completo a lógica democrática. Em uma República, o povo é o soberano; os poderes, seus servidores. Quando uma ministra do Supremo diz que, sem a Corte, cada brasileiro seria um tirano em potencial, ela deixa claro que não confia na cidadania como base da liberdade, mas deposita todo poder no Estado e em seus ministros. O STF, que deveria atuar como garantidor das liberdades individuais contra eventuais abusos do Legislativo e do Executivo, passa a se enxergar como tutor moral e intelectual de uma massa considerada incapaz de viver em liberdade plena.
A frase de Cármen Lúcia não é isolada. Ela se soma a outras manifestações recentes de ministros que, ao invés de reforçarem o poder do cidadão sobre o Estado, parecem reivindicar para si um poder absoluto sobre o cidadão. Esse tipo de visão é a antítese do constitucionalismo liberal. No Brasil, cada vez mais, vemos uma inversão de valores: o Estado como supremo soberano e o povo, mero súdito.
Quando o Judiciário abandona o seu papel de garantidor das liberdades para se tornar um poder tutelar, abre-se espaço para autoritarismos disfarçados de “proteção”. E nesse caminho, a democracia se torna apenas um enfeite institucional, enquanto o verdadeiro poder passa a residir nas mãos de poucos iluminados que julgam saber o que é melhor para todos.
A fala de Cármen Lúcia precisa ser debatida, pois desnuda o que muitos já percebiam: em vez de verem no povo brasileiro a origem legítima do poder, alguns ministros parecem enxergar apenas um rebanho de “pequenos tiranos” a serem vigiados, silenciados e conduzidos. E esse, talvez, seja o verdadeiro tiranismo que ameaça a liberdade no Brasil.
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